Fotogrametria para Arcadas Dentárias - Protocolo e Comparação ============================================================= .. figure:: images/Protocolo_fotogram_dentes.jpg :align: center Modelo digitalizado com fotogrametria. Introdução ---------- Com o advento das novas tecnologias o trabalho do setor odontológico que outrora fora completamente analógico, tem sido portado dia após dia para o campo digital. No entanto, haver opções digitais não implica necessariamente em poder absorvê-las, ainda mais quando se observa o alto custo de software e equipamentos como scanners intraorais. Felizmente existem alternativas gratuitas que entregam bons resultados de digitalização e edição de arcadas dentárias e o presente material tem por objetivo apresentar uma delas, com ferramentes disponíveis na internet e equipamentos presentes em parte considerável de todas as habitações do planeta. Munido de um computador mediano, um tecido escuro e uma câmera digital simples, um indivíduo bem treinado poderá digitalizar em 3D um modelo de arcada dentária com grande precisão. Como Fazer as Fotografias ------------------------- Como abordado no início do documento, o objetivo é criar um ambiente onde parte significativa das pessoas possam replicar o protocolo. .. figure:: images/ArcadaInteresse.png :align: center Modelo de gesso preparado para a fotogrametria. Para que a fotogrametria funcione o modelo precisa receber um tratamento que consiste em pequenos riscos nas arestas principais e quadriculados em regiões mais planas (Fig. 2). Caso isso não seja feito, quase que certamente a fotogrametria não gerará bons resultados. Não há necessidade de fazer o tracejado em todo o modelo, apenas nas regiões de interesse como os dentes e parte da gengiva. .. figure:: images/Fotogrametria_Arcada.jpg :align: center Preparo da cena e fotografia de um modelo de gesso. A imagem ilustra com objetividade os passos a serem seguidos (Fig. 3). Será necessária uma pequena estrutura para dar suporte ao fundo do pequeno cenário, no exemplo foi usada uma caixa que pode ser de sapato **(A)**. Um tecido escuro foi colocado sobre a caixa, pode ser uma camiseta, só é necessário que não contenha imagens ou padrão, mas apenas uma cor. Em seguida o modelo é posicionado ao centro da parte mais baixa da estrutura **(B)**. Por fim o usuário pode fazer as fotografias alternando as alturas e respeitando os limites do fundo, de modo prático, sem a necessidade de um suporte para a máquina **(C)**. A rotação do modelo é feita com uma das mãos, logo, com uma mão o usuário segura o *smartphone* e fotografa e com a outra ele faz pequenas rotações na peça. O processo leva em média dois minutos, para que serjam tiradas de 64 a 72 fotos em duas alturas. Para saber como a rotação é feita, veja esse vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=or6Y0q__i9Q As fotos precisam ser feitas em duas alturas direfentes, nos moldes do protocolo de fotogrametria de crânio descrito em :ref:`Cranio_circulo_duplo`. .. warning:: Lembre-se que o *smartphone* ficará na mesma posição, o que vai ser rotacionado é o objeto e como o fundo é escuro o algoritmo vai ignorá-lo, como se as fotos fossem feitas em círculos. .. figure:: images/FotosRot.png :align: center Fotografias da arcada. As fotos resultantes simulam uma rotação em torno do objeto (Fig. 4), elas são copiadas e coladas em um diretório com apenas essa sequeência, seguindo as observações disponíveis em :ref:`Fotogrametria_Face_Organizacao`. Resultados da Fotogrametria --------------------------- Para este estudo digitalizamos as arcadas nos três sistemas de fotogrametria oferecidos pelo OrtogOnBlender: OpenMVG, SMVS e MeshRoom. .. figure:: images/CamparaArcara.png :align: center Resultado bruto das fotogrametrias. Não houve grande diferença visual entre as três fotogrametrias (Fig. 5). Em ordem vemos o modelo gerado pelo OpenMVG (à esquerda), SMVS (centro) e MeshRoom (à direita). .. figure:: images/CamparaArcara2.png :align: center Resultado da fotogrametria com atribuição de smooth no modelo à esquerda. Houve uma pequena diferença na superfície da digitalização feita pelo OpenMVG por conta do valor do **Smooth Factor** que ficou em **2**, o que foi corrigido na imagem de exemplo (Fig. 6) com a ativação do modificador **Smooth** no valor do **Repeat** em 12, assim os modelos ficaram ainda mais parecidos, mostrando que fotos feitas corretamente garantem bons resultados em sistemas distintos de fotogrametria. Uma informação importante antes de seguirmos com mais explanações é sobre os pontos utilizados para o redimensionamento do modelo. Como se trata de uma estrutura pequena é importantíssimo tomar os pontos mais extremos possíveis. .. figure:: images/ArcadaMede.png :align: center Medida dos pontos mais extremos do modelo. No caso da arcada usada neste documento, optou-se por um ponto na gengiva, logo atrás do molar e outro entre os incisivos, totalizando 56,5 mm (Fig. 7). .. tip:: O usuário pode fazer dois pequenos pontos com uma canetinha de cor diferente, para posteriormente posicionar os marcadores de dimensão em um local compatível com a medida inicial. .. warning:: Não use medidas pequenas como 10 mm (1 cm) ou 20 mm como referência. Quanto menor a distância de referência, maior poderá ser a margem de erro no redimensionamento! Preparo para a Comparação ------------------------- .. figure:: images/ArcadaScan.png :align: center Escaneamento intraoral. Para termos uma ideia da precisão da fotogrametria optamos por compará-la ao escaneamento intraoral, posto que o mesmo se trata de um modelo bastante fiel a estrutura original (Fig. 8). .. figure:: images/ArcadaScanModelo.png :align: center Escaneamento intraoral e a fotogrametria do modelo. O escaneamento intraoral foi efetuado na arcada completa com todos os dentes e a prótese. Já o modelo, foi feito sem a Próstese de um dos molares (Fig. 9). .. figure:: images/ArcadaAlinhados.png :align: center Fotogrametrias alinhadas ao escaneamento intraoral. Ao alinharmos as fotogrametrias ao escaneamento intraoral, as partes faltantes ficam evidentes (Fig. 10). .. figure:: images/ArcadaLimitador.png :align: center Todos os modelos com o elemento limitador em laranja. Para contornar a situação, foi citado um elemento limitador contemplando uma região que abordava todas as malhas (Fig. 11). .. figure:: images/ArcadaLimitador2.png :align: center Malhas resultantes da booleana de intersecção a partir do limitador. Em seguida separou-se a mesma região de todas as malhas usando a booleana *Intersect* (Fig. 12). Todas as malhas foram então exportadas como .STL para serem comparadas no CloudCompare. Comparação das Malhas --------------------- Para comparar as malhas foi utilizada a limitação de distância de +0,30 e -0,30 mm, ou seja, menos de um terço de milímetro. Tudo o que estivesse fora estes limites foi excluído como explicado em :ref:`Como_Funciona_comparacao_malhas`. .. figure:: images/Comp_OpenMVG_030_mm.png :align: center OpenMVG (sem smooth) vs. Scanner. Na primeira comparação do OpenMVG vs. Scanner (Fig. 13) vemos que no geral a diferença acabou tendendo a zero, como apresentado no gràfico à direita, no entanto houveram uma série de falhas na gengiva e em algumas partes não traçadas dos molares. .. figure:: images/OpenMVG_top.png :align: center OpenMVG (sem smooth) vs. Scanner - topo. Na imagem em topo (Fig. 14) vemos que a maioria das regiões dos dentes que excederam os 0,30 mm de diferença estavam "para fora" dos limites da peça de referência, como é atestado pela cor vermelha. Isso acontece porque o algoritmo de fotogrametria tem uma certa dificuldade de reconstruir arestas, tendendo a atenuar a estrutura e não documentar completamente alguns acidentes da superfície. Já na região da gengiva a malha gerada estava "para dentro" da referência, por isso a cor azul. .. figure:: images/BoxAlinhadas.png :align: center Malhas de teste alinhadas - textura. Para entender melhor o que isso significa, criamos um modelo de caixas sobrepostas e o pigmentamos com uma textura plena de contrate, de modo a ser facilmente digitalizado por fotogrametria (Fig. 15). Esse modelo (primeiro à esquerda) foi fotografado digitalmente, através do processo de renderização. Em seguida as imagens resultantes foram digitalizadas em 3D por fotogrametria resultando em três outra malhas, da esquerda para a direita: OpenMVG, SMVS e MeshRoom. .. figure:: images/BoxAlinhadas2.png :align: center Malhas de teste alinhadas - solid. A textura serviu apenas para facilitar a fotogrametria, ao retirarmos a visualização da mesma, podemos contemplar apenas a estrutura de cada uma das malhas e analisar a sua precisão (Fig. 16). .. figure:: images/BoxAlinhadas3.png :align: center Parte superior do elemento de teste. O modelo de teste é composto por 5 caixas sobrepostas (FIg. 17), reduzidas sequêncialmente para 30% do tamanho anterior, de modo que a primeixa caixa tenha os lados com 20mm e a última com 0,54 mm, ou seja, um pouco mais de meio milímetro. O objetivo do experimento é termos um elemento de controle para comparar com as fotogrametrias. .. figure:: images/BoxAlinhadas4.png :align: center Malha de teste original vs. fotogrametrias. Ao contemplarmos as porções de menores dimensões (Fig. 18), podemos ter uma ideia dos limites de precisão das fotogrametrias. Da esquerda para a direita: Original, OpenMVG, SMVS e MeshRoom. .. figure:: images/BoxAlinhadas5.png :align: center Malhas sobrepostas. Ao compararmos as malhas alinhadas (Fig. 19) podemos ver claramente que há uma tendência das fotogrametrias acompanharem a forma geral, ainda que extrapolem as mesmas em alguns pontos. O destaque aqui fica por conta da malha gerada pelo OpenMVG+OpenMVS, que segue bem a forma original a ponto de confundir-se com a mesma na maior parte da estrutura, até chegar no pequeno elemento da parte superior, onde evidentemente não há resolução suficiente na digitalização, mas mesmo assim aproximou-se mais do que as demais soluções. Outra característica a ser observada é o leve arredondamento nas arestas em cantos retos. Isso não é um problema quando o objeto é grande, mas fica evidente nas partes menores, como vimos acima. .. figure:: images/Comp_OpenMVG_030_smooth_VS.png :align: center OpenMVG normal (à esquerda) e com smooth (à direita). Continuando com a peça do OpenMVG (Fig. 20), foi atribuído a ela o modificador *Smooth* e comparada novamente com o escaneamento intraoral. Os resultados foram praticamente os mesmos da fotogrametria normal, ou seja, atribuir o modificador pode melhorar a aparência da peça, sem comprometer a sua precisão. .. figure:: images/Comp_SMVS_030_mm.png :align: center SMVS vs. Scanner. O resultado da fotogrametria com o SMVS apresentou resultados muito parecidos com o a do OpenMVG, com alguns buracos no pré-molar por conta da extrapolação excessiva da malha (Fig. 21). .. figure:: images/Comp_MeshRoom_030_mm.png :align: center MeshRoom vs. Scanner. A mesma situação ocorreu com o MeshRoom, ao apresentar falhas no pré-molar (Fig. 22). Melhorando a Precisão da Fotogrametria -------------------------------------- A tomada de fotogrametria apresentada anteriormente seguiu o protocolo simples de digitalização de objetos, isso significa que foram feitas mais ou menos 72 fotos em duas alturas diferentes, mantendo a mesma distância do objeto fotografado. Se por um lado o protocolo se destaca pela sua simplicidade e bons resultados gerais, por outro pode apresentar problemas quando utilizado em superfícies complexas e com pequeno detalhes, como é o caso do modelo utilizado neste estudo. *Em face deste problema, haveria uma forma de melhorar os resultados e gerar uma malha mais compatível com o elemento original?* Sim e a chave para a solução mora justamente na forma de se fotografar o objeto. .. figure:: images/Caixas.png :align: center Malha de controle da fotogrametria. Se analisarmos a malha de controle utilizada anteriormente (Fig. 23), atestaremos que a mesma se trata de 5 caixas sobrepostas. Olhando mais de perto veremos que além de se tratarem da mesma estrutura (caixa) também contam com a mesma textura (padrão colorido), isso significa que é a mesma caixa copiada, reduzida e centralizada. .. figure:: images/Caixas_2.png :align: center Fotogrametria da malha de controle. Ao observarmos o resultado da fotogrametria do OpenMVG (Fig. 24) vemos que o modelo ficou bem digitalizado nas partes inferiores onde as caixas são maiores, mas foi perdendo resolução na parte superior. Como explanado anteriormente, o protocolo de fotogrametria é feito em círculo mantendo o *smartphone* **na mesma distância** de modo a enquadrar o objeto, logo, os detalhes do mesmo podem não ficar muito visíveis nas fotos. Não tendo boa visibilidade a reconstrução pode ser feita sem muita resolução, posto que o algoritmo não terá informações suficientes para a reconstrução! *Qual seria a solução para esse problema?* A solução é fotografar mais de perto, não apenas a região de interesse da arcada e gengiva, mas também alguns dentes. .. figure:: images/DentesProtoAntes.png :align: center Tomadas com o protocolo simples. Na tomada com o protocolo simples (Fig. 25) o objetivo é enquadrar todo o objeto, ao fazer isso o algoritmo reconstruirá não apenas a região de interesse, mas toda a estrutura, reduzindo a resolução dos elementos menores e dos próprios dentes. .. figure:: images/DentesProtoPerto.png :align: center Tomadas gerais mais próximas. Nas novas tomadas as fotografias são feitas mais próximas à região de interesse, utilizando o zoom do equipamento (Fig. 26). .. figure:: images/DentesProtoPerto2.png :align: center Rotação na região do segundo molar. Além das duas rotações gerais o usuário pode fazer pequenas outras rotações, como nos molares (Fig. 27) e pequenos arcos em torno de estruturas de interesse específicas. Para essa fotogrametria foram feitas 116 tomadas que levaram um tempo total de **2 minutos e 11 segundos**, um pouco mais do que 1 minuto e 52 segundos da tomada inicial com 64 fotos. .. figure:: images/Precisao.png :align: center Modelo resultantes das 116 fotografias - sem smooth. O modelo resultante, a partir do OpenMVG apresentou uma significativa melhora de detalhes (Fig. 28). .. figure:: images/OpenMVG_perto_6.png :align: center Comparação de 116 (próximas) vs. 64 fotos (distantes). O detalheamento é evidenciado quando comparado com o cálculo anterior (à direita) com menos fotos (Fig. 29). Até o pino do primeiro molar, que não era foco do escaneamento foi digitalizado com significativo incremento de resolução. .. figure:: images/OpenMVG_perto_1.png :align: center OpenMVG vs. Escaneamento intraoral. Ao compararmos o modelo da fotogrametria com o proveniente do escaneamento intraoral, já não vemos as falhas nos pré-molares e molares (Fig. 30). .. figure:: images/Compara64_116.png :align: center Comparações perfiladas. As perfilarmos as comparações de malhas (Fig. 31) vemos que a tomada de 64 fotos mais distantes tinha uma gráfico de distanciamento mais distribuído (à esquerda), já a comparação com o modelo proveniente das 116 fotos próximas gerou um gráfico com distanciamento menor com mais resultados próximos ao zero. .. figure:: images/Compara_grafico_64_116.png :align: center Comparação dos gráficos. Para ilustrar melhor o ocorrido, basta alinhar os dois gráficos (Fig. 32). Na parte superior temos o modelo proveniente as 64 fotos, perceba que o gráfico das diferenças está mais distribuído ao longo do +0.30 e do -0.30 mm. Já o gráfico do modelo proveniente das 116 fotos próximas tem uma maior concentração de distâncias em espaços menores, isso significa que o modelo é mais compatível com o escaneamento intraoral. .. figure:: images/OpenMVG_perto_2.png :align: center OpenMVG vs. Escaneamento intraoral - visão em topo. Como a digitalização mostrou-se mais compatível com o modelo proveniente do escaneamento intraoral, esperava-se que os dentes não apresentassem falhas ocorridas anteriormente, com as 64 fotos. No entanto, é possível verificar que elas ocorreram em um dos incisivos e as mesmas não estavam presentes na fotogrametria anterior que contava com menos precisão (Fig. 33). .. figure:: images/ComparaBolhas.png :align: center Bolhas de ar evidenciadas na comparação de malhas. O fato é que as falhas atestam a precisão do escaneamento (Fig. 34). Ao analisarmos mais de perto o modelo de gesso, percebemos pequenas bolhas e estas foram capturadas pela fotogrametria! Basta lembrar que o escaneamento intraoral está completo e que as bolhas foram criadas no momento da colocação do gesso, por isso a falha. A bolhas excederam o limite de 0,30 mm proposto na comparação. Conclusão --------- O presente estudo evidencia a possibilidade de uso da fotogrametria na digitalização de modelos de arcadas dentárias utilizando tecnologia acessível a um grande número de indivíduos. O protocolo proposto para uma maior precisão envolve também um número maior de fotos, mais próximas a área de interesse geral, bem como de regiões específicas. Ao final o tempo da tomada não aumenta consideravelmente quando comparada com o protocolo simples de duas voltas, viabilizando a abordagem detalhada. Em trabalhos que demandam um grande número de digitalizações o processo de captura pode ser delegado a um disponsitivo automático baseado em Arduino ou tecnologia afim. Agradecimentos -------------- Agradecemos a `Clínica Santa Isabel `_ por proceder com o escaneamento intraoral que viabilizou a publicação deste estudo.