A alegria de ter o trabalho noticiado em 51 idiomas!

Entendo pouquíssimo de estatística, volta e meia leio alguma coisa ou escuto um podcast para tentar compreender melhor o funcionamento desse campo do saber. Só que mesmo sem entender muita coisa, adoro acompanhar os números, porcentagens, rankings e afins, pois parece que eles tem alguma mensagem importante, parece que esses dados tem algo a nos dizer, só que a falta de conhecimento e experiência muitas vezes não nos permite acessar essa informação. Mesmo assim, a intuição teima em se manter cativa daquela mensagem cifrada.

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Em 2012 participei pela primeira vez de um projeto internacional, chamada do “Taung Project”. Estabelecido a partir de uma parceria entre o grupo de pesquisas Arc-Team, a ONG Antrocom, a Universidade de Pádua e eu, o projeto consistia em reconstruir a face da Criança de Taung a partir de um fóssil de 2,5 milhões de anos. Foi muito gratificante ver o feito noticiado em… uau! 3 idiomas! italiano, Inglês e português. Lembro que até teve uma nota no jornal Correio Brasiliense. Para um novato no campo da mídia, aquilo foi fantástico e quase imensurável.

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Em 2014 compus o grupo que reconstruiu a face de Santo Antônio e de fato, aquele sim foi um tremendo viral, as notícias sobre o trabalho se distribuiu pelo mundo. Como bom amante da coleta de dados, inicialmente procurei reunir todas as notícias sobre o assunto, no entanto, a técnica mostrou-se ineficiente depois de um tempo, pois a propagação de notícias foi tamanho que fugiu ao nosso controle.

Percebendo que não adianta contar o número de meios, decidi mudar a abordagem e foquei nos diferentes idiomas aos quais as notícias foram veiculadas. A explicação era muito simples, de um lado seria mais fácil contemplar a propagação, pois quanto maior o número de línguas diferentes, maior era a penetração da notícia no mundo. De outro, quase todo mundo sabe que aprender um idioma não é uma tarefa trivial, geralmente as pessoas sabem a língua nativa e pronto, mal conseguem ler um parágrafo em outra. Então, tecnicamente, quanto mais exóticos os idiomas abordados, tanto maior seria a distribuição da informação pela comunidade global. Desde Wall Street até a aldeia mais remota teria ouvido falar do trabalho.

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A técnica mostrou-se tão boa, que eu mantive o seu uso até hoje. E justamente por esses dias, decidi fazer um amplo levantamento sobre tudo o que foi veiculado acerca dos trabalhos que participei.

Além da piração na batatinha esse post ilustra uma série de vitórias pessoais, pois na maioria dos casos de propagação das notícias eu estive presente, projetando as possibilidades, entrando em contato com os meios e criando ações que promovessem os projetos no âmbito global. Durante esses anos aprendi muita coisa e conheci muitos profissionais da comunicação. Eles desempenham um trabalho importantíssimo e quem me abriu a mente para isso foi um acadêmico de respeito, o arqueólogo Dr. Moacir Elias Santos:
– Cícero, as notícias são parte fundamental de um projeto, trata-se de documentação histórica!

Como funciona o levantamento

Para conseguir isolar os números, escolhi 14 projetos que participei entre 2012 e 2016. O critério principal era o número de idiomas diferentes em que as notícias sobre cada projeto foram veiculadas.

Separei os projetos por colunas e os idiomas por linhas. Criei grupos e extraí todas as ocorrências diferentes, o número final foi que 51 LÍNGUAS DIFERENTES propagaram as notícias! Um número de respeito.

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Os projetos escolhidos foram:

A prótese 3D da jabota Freddy, a prótese 3D da arara Gigi, a reconstrução facial do Senhor de Sipán, a reconstrução facial de Santo Antônio de Pádua, a reconstrução facial do “vampiro” de Celakovice, as notícias agrupadas sobre a reconstrução facial dos santos e beatos católicos, a prótese 3D da gansa Vitória, a prótese 3D da cadela Hanna, a reconstrução facial de Santa Maria Madalena, a mostra italiana FACCE della Evoluzione, a reconstrução facial de São Martinho de Porres, a prótese 3D do araçari Tuc tuc, a reconstrução facial de Santa Paulina e a reconstrução facial de Santa Rosa de Lima.
O resultado foi óbvio, quanto maior a novidade e o interesse geral, maior o número de idiomas. Mas isso não significa necessariamente que os assuntos com menos idiomas viralizaram menos em regiões específicas. A jabora Freddy que detém o recorde de 45 idiomas teve um primeiro boom em 2015 na mídia nacional e pouca repercussão internacional, o que só ocorreu em 2016 devido a uma série de fatores. A arara Gigi teve menos repercussão nacional em relação a Freddy, mas foi a primeira notícia sobre prótese a ganhar o mundo. Parte da viralidade da Freddy se deve a notoriedade provocada pela Gigi.

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No caso dos santos, o primeiro viral foi a reconstrução de Santo Antônio de Pádua, em parte pela popularidade da figura e em parte pelo ineditismo do projeto. Isso faz parecer que os outros santos não tiveram tanta penetração da mídia, mas não se trata disso. No caso de São Martinho de Porres e Santa Rosa de Lima, as notícias foram amplamente e densamente veiculadas nos meios peruanos de comunicação. Regionalmente, destaca-se a propagação da reconstrução de Santa Paulina, presente seguidas vezes nos principais canais de TVs, sites e periódicos de Santa Catarina e São Paulo.

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Estrategicamente falando, as notícias sobre a operação do Araçari, apesar do número baixo de idiomas em relação aos outros, foi muito importante para firmar a popularidade dos nossos trabalhos com próteses, pois foi veiculado em várias oportunidades em TVs abertas da Alemanha e França. Ainda nessa linha, destaca-se a reconstrução do Senhor de Sipán, pois mesmo se tratando de um assunto que inicialmente aguçaria a curiosidade apenas aos indivíduos ligados em antropologia, acabou mostrando-se de interessante ao público geral dando origem a uma série de reportagens de TV. A reconstrução facial do “vampiro” de Celakovice, contrariando a tendência de viralizar em seu país de origem, a República Tcheca, acabou se tornando notícia amplamente propagada em russo e vietnamita.

Outra informação importante está relacionada a reconstrução da Criança de Taung. Apesar dos dados parecerem pobres num primeiro momento, a verdade é que a imagem principal do trabalho tem sido usada em inúmeras matérias pelo mundo inteiro. No entanto, eu decidi contar apenas aquelas que tratam da reconstrução em si, não de um assunto relacionado a evolução humana, pois se assim o fosse, o número de idiomas aumentaria significativamente, colocando o projeto entre a as primeiras posições.

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Um gráfico com as ocorrências dos idiomas diferentes foi gerado e acabou revelando algumas situações curiosas.

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Antes de fazer a pesquisa eu imaginava que no top 3 constaria 1) Português, 2) Espanhol e 3) Inglês. O que aconteceu foi surpreendente, português e inglês estão “pau a pau” ou seja, mesmo eu estando no Brasil e falando pelos fonemas da última flor do Lácio, a propagação é a mesma, ou maior no idioma de Shakespeare.

O espanhol vem um pouco atrás em segundo, com 12 ocorrências, o chinês… quem diria, vem em terceiro junto com o alemão e o italiano. Fechando o top 4, temos o francês.
Não muito atrás vemos o russo, árabe, polonês, persa e vietnamita. Fiquei impressionado com a ocorrência, eles aparecem em parte significativa dos materiais. Isso pode indicar um interesse acentuado por parte dos falantes em relação aos assuntos abordados nos projetos.

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Outra abordagem foi contar o acumulado de ocorrências em todos os projetos de cada ano. Em 2012 foram apenas 3, com a reconstrução da Criança de Taung. Em 2014 foram os 18 da reconstrução facial de Santo Antônio. Em 2015 um salto para 78 e em 2016 um número levemente elevado, 89.

Creio que seja difícil manter esse crescimento em 2017 e o próprio gráfico indica que isso pode acontecer, com uma curva que lembra desaceleração.
A propósito, quase todas as reportagens colhidas para a pesquisa estão disponíveis para acesso no meu clipping pessoal: https://docs.google.com/document/d/1Zj6fsG-w9oFyHUFx_pPX58Uxn1xdi-KN3lOfYvgrFlg/edit?usp=sharing

Conclusão

Foi bastante divertido fazer esse levantamento de dados. Com isso pude me atentar para um potencial público alvo no tocante a projetos futuros. Ainda não absorvi bem essa ideia de 51 idiomas diferentes, parece mentira mesmo diante de todo o planejamento que fiz a longo prazo.
É sempre importante deixar bem claro que tudo isso só foi possível porque os projetos foram acontecimentos sustentados por um poderoso grupo de pessoas e instituições.
Deixo então os meus agradecimentos ao Arc-Team da Itália, Antrocom, Universidade de Pádua, Animal Avengers, CTI Renato Archer, Instituto Everton da Rosa, Universidade Inca Garcilaso de la Vega, Museu Rosa Cruz, Dr. Moacir Elias Santos, Mari Bueno, NEO-GEO, EBRAFOL, Museo Tumbas Reales de Sipán, Basílica de Santa Maria Madalena, ABHRAGI, Faculdade FASIPE, Dr. José Luís Lira, Dr. Marcos Paulo Salles Machado, Dr. Jorge Vicente Lopes da Silva, Dr. Paulo Miamoto, Dr. Roberto Fecchio, Dr. Rodrigo Rabello, Dr. Sergio Camargo, Dr. Matheus Rabello, Santiago Gonzáles, Aleksandro Montanha, Fernando Brandão, Viviane Bulgarelli, Janet Tappin Coelho, Robson Coelho, Deivison Pinto, Adriano Barreto, Denise Coelho e tantas outras pessoas e instituições que lembrerei ao logo do tempo, a todos o meu MUITO OBRIGADO!

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